Toffoli ignorou conflito de interesse ao suspender multa bilionária, diz Conrado Hubner Mendes

Em entrevista ao Estadão, o professor de Direito Constitucional na USP diz que fato de esposa de ministro advogar para a J&F autoriza desconfiança sobre sua imparcialidade; Para Conrado Hubner, a Operação Lava Jato cometeu abusos e já foi ‘enterrada e desmoralizada’, mas a confissão de atos de corrupção por empresários e executivos ‘não pode ser anulada numa canetada’.


CONRADO HUBNER MENDES. FOTO DENISE ANDRADE / ESTADAO

O jurista Conrado Hubner Mendes, professor de Direito Constitucional na Universidade de São Paulo (USP), considera “profundamente equivocadas e inapropriadas” as decisões do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, que suspenderam as multas bilionárias dos acordos de leniência das empresas Novonor (antiga Odebrecht) e J&F.

Para o professor, o problema começa no fato de o ministro ter agido por meio de uma decisão monocrática, sem manifestação imediata do plenário do STF, a despeito do impacto e da relevância do tema. A situação piora pelo fato de sua mulher, a advogada Roberta Rangel, prestar assessoria jurídica para a J&F. “O reconhecimento de conflito de interesse é uma regra muito elementar do judiciário civilizado e o Toffoli ignorou isso”, afirmou o professor, em entrevista exclusiva ao Estadão.

Mas no âmago da questão está a fundamentação jurídica do ministro, que Hubner Mender classificou como “árida e abstrata”. Para ele, a justificativa de que há dúvida sobre a voluntariedade das empresas nos acordos de leniência é “forçado”. “Quando a pessoa está sob tortura, seja física, seja moral, é possível questionar a voluntariedade daquilo que ela aceita fazer. É diferente a situação dos maiores empresários do País, com os advogados mais caros, sentando à mesa para negociar.”

Ele diz ainda que a fundamentação das decisões do ministro é “basicamente” composta por “lugares-comuns” e críticas à Lava Jato. O professor não questiona as críticas e concorda que houve abusos e arbitrariedades na operação, mas afirma que as “frases genéricas” não valem como fundamentação jurídica para a suspensão de acordos construídos com revelações confessas de corrupção.

Para o professor, há atualmente um esforço interessado e lucrativo contra o que restou da operação. “A Lava Jato já foi enterrada e desmoralizada há muito tempo”, avalia ele, mas pondera que parte do grupo que se autodenomina antilavajatista – principalmente os que tem interesses advocatícios no tema – se metamorfoseou com o tempo. “É importante e lucrativo, para essa advocacia, manter a sombra da ameaça da Lava Jato bem viva, pois essa estratégia é um atalho retórico para defender seus clientes.”

Leave a Reply